O Assassino de Macario - Comedia em tres actos
84 pages
Português

O Assassino de Macario - Comedia em tres actos

Le téléchargement nécessite un accès à la bibliothèque YouScribe
Tout savoir sur nos offres
84 pages
Português
Le téléchargement nécessite un accès à la bibliothèque YouScribe
Tout savoir sur nos offres

Informations

Publié par
Publié le 08 décembre 2010
Nombre de lectures 44
Langue Português

Extrait

Project Gutenberg's O Assassino de Macario, by Camilo Castelo Branco This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this eBook or online at www.gutenberg.net
Title: O Assassino de Macario  Comedia em tres actos Author: Camilo Castelo Branco Release Date: October 13, 2008 [EBook #26913] Language: Portuguese Character set encoding: ISO-8859-1 *** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK O ASSASSINO DE MACARIO ***
Produced by Pedro Saborano and the Online Distributed Proofreading Team at http://www.pgdp.net (This book was produced from scanned images of public domain material from the Google Print project.)
  
O ASSASSINO DE MACARIO
  Porto--Imprensa Moderna   
CAMILLO CASTELLO BRANCO  
O ASSASSINO DE MACARIO
 COMEDIA EM TRES ACTOS  VERSÃO LIVRE  Expressamente coordenada para a festa artistica do ACTOR DIAS  2. EDIÇÃO ª
 
 PORTO LIVRARIA CHARDRON De Lello & Irmão, Editores 1903
  Propriedade absoluta dos editores   Reproducção interdicta em todos os paizes  
PERSONAGENS  Barnabé. Liborio. Itelvina. Sebastiana. A scena é no Porto.
Esta comedia não póde ser representada sem auctorisação dos editores, para quem ficam reservados todos os direitos.    
ACTO PRIMEIRO Sala elegante. Porta ao fundo. Portas lateraes no segundo plano. Janella á esquerda, no terceiro plano. Piano encostado á parede direita, no primeiro plano. Canapé á esquerda. Dois contadores pequenos á esquerda e direita. Sophás, cadeiras, e tamborete de piano. Sobre o contador da esquerda utensilios de barbear e espelho. No outro um relo io.
SCENA I Barnabé, () (Entra pela esquerda, trajo da manhan, traz na mão uma chocolateira e toalha. Chama:) Sebastiana!... Isto é que foi dormir alarvemente! (Olhando para o relogio) Já dez horas... e eu sem fazer a barba! (chamando) Sebastiana! Esta creada é uma calaceira!... Não ha d'outras... Tive um sonho... Isto de sonhos é uma tolice... Sonhei que estava pescando á[8] cana... n'uma cazinha campestre, com transparentes verdes... e um repucho!... Ah! o meu sonho d'oiro!... Logo que eu cazar a filha... Um repuxo... (chamando) Sebastiana! Com effeito! (Vai á porta do fundo) Sebastiana! Sebas...
SCENA II Sebastiana e Barnabé SEBASTIANA (entrando pelo fundo estou, senhor!) Aqui BARNABÉ Não me tinhas ouvido? SEBASTIANA Perfeitamente. O senhor chamou-me quatro vezes. BARNABÉ Então porque não vieste logo? SEBASTIANA Estava a almoçar. Acho que o senhor não pretende que os creados não comam. BARNABÉ Não... SEBASTIANA Além d'isso, eu sei que o senhor é pachorrento, um paz d'alma... BARNABÉ Abusas um pouco do meu temperamento. SEBASTIANA Está enganado... eu pelo senhor era capaz de me atirar ao lume... BARNABÉ Pois bem, vai atirar ao lume esta chocolateira... Quero barbear-me. (Dá-lh'a)
SEBASTIANA
[9]
Dentro de 15 minutos aqui estou. (Vai sahir). BARNABÉ (chamando) Olha, Sebastiana... SEBASTIANA (tornando) Não me mande fazer duas coisas ao mesmo tempo que me atrapalha, ouviu?[10] BARNABÉ (á parte) É uma creada como se quer! Boa bisca... (alto) Olha lá... Noto que vae na caza um socêgo extraordinario! Minha filha estará doente? SEBASTIANA Não senhor; sahiu de manhan cedo. BARNABÉ Ah! é isso? (Senta-se no canapé). SEBASTIANA E, na verdade, a menina faz um estardalhaço! credo!... E é de pasmar como o snr., tão manso, tão socegado, fez uma filha tão... BARNABÉ Tão estapafurdia, pódes dizer... SEBASTIANA É isso, estapafurdia... é uma trovoada... credo! BARNABÉ Tu que queres?... A natureza tem desconcertos... Olha, Sebastiana, eu nem sempre vivi dos meus rendimentos.[11] SEBASTIANA Pois sim, sim... BARNABÉ Tive uma fabrica de ligas em Fradellos. SEBASTIANA De ligas? ora vejam... BARNABÉ Fazia pouco negocio... Resolvi ir para o Mexico, por que n'um paiz, n'um paiz quente, bem percebes, mostra-se mais a barriga das pernas... Fundei o meu estabelecimento no Mexico, e grangeei logo toda a freguezia das boas pernas do paiz... com sáias curtas. SEBASTIANA Olha que pechincha!...
BARNABÉ
Vais vêr... um par das taes pernas... duas buxas fizeram-me uma impressão profunda... Todas as profissoens tem os seus perigos... Esposei...[12] SEBASTIANA As taes buxas? BARNABÉ Sim... Ella chamava-se Dolores. Sete mezes depois, tinha uma filha... SEBASTIANA Sete mezes só? ora essa!... BARNABÉ No Mexico a vegetação cresce muito depressa, é o que é; e isso mesmo te explica o genio impaciente da minha Itelvina... Ella não quiz esperar que se completassem os nove mezes... sahiu... SEBASTIANA Não admira, não... BARNABÉ E aqui tens tu, Sebastiana, como eu, um portuguez de lei, sou pae d'uma mexicana... SEBASTIANA Agora é que eu percebo a differença dos dois genios.[13] BARNABÉ O ceo do Mexico! Os costumes d'esse clima de fogo! Minha filha tem nas veias o meu sangue; mas... mais quente... ferve-lhe mais... em fim, tem uma temperatura mais alta... SEBASTIANA Acho que sim... intendo. BARNABÉ Ha-de haver um anno que passei o negocio e vim para a patria... Estava rico... primeira felicidade; estava viuvo, segunda feli... Emfim, como não nos davamos bem... segunda felicidade, está dito. SEBASTIANA Então não se davam bem... BARNABÉ Quero dizer... a senhora Barnabé... era muito fogosa... muito atiradiça... e chamava-me... maricas. SEBASTIANA Credo! BARNABÉ Em fim ella tinha desculpa... Eu bem me conheço... Mesmo hoje, com minha filha, sou uma lesma, um fracalhão... Ahi está ella a querer casar
[14]
com o valdevinos do Macario. SEBASTIANA Mas não basta querer ella. BARNABÉ Assim é; mas ella quer á fina força e eu não quero; a final, quem hade vencer é ella, que é a forte, e casará! São favas contadas. Era o mesmo com minha mulher. Dizia-lhe eu «quero»; respondia-me ella «não quero», e eu... moita... nem palavra. SEBASTIANA Então estavam sempre de harmonia? BARNABÉ Está claro. (Rumor fóra) SEBASTIANA (indo á janella) Que será isto? BARNABÉ Algum choque do americano com o Rippert. SEBASTIANA Nada, parece desordem... Tanta gente defronte da porta... BARNABÉ Da nossa? SEBASTIANA Sim, snr. Quer que eu vá saber o que é? BARNABÉ Não... que me importa a mim?... Olha se me aqueces a agua... anda.
SCENA III Os mesmos e Itelvina (Abre-se com estrondo a porta do fundo. Itelvina entra afogueada e passeia muito colerica.) BARNABÉ Ólá!... és tu? ITELVINA Sim, sou eu. Bom dia. BARNABÉ Tu que tens? ITELVINA Estou furiosa! (Passa para a direita.)
[15]
[16]
BARNABÉ
D'onde vens? ITELVINA De pregar uma bofetada n'um sujeito. BARNABÉ Fizeste isso? ITELVINA N'um atrevido... BARNABÉ Talvez imaginasses... ITELVINA Qual imaginasse! um grosseirão que ousou dizer-me cara a cara: «a menina é encantadora.» BARNABÉ E bateste-lhe por isso? Que farias tu se elle te chamasse estafermo?[17] ITELVINA O seu sangue frio, meu pae, quando sou insultada! Castiguei-o, e espero que a scena se não repita. BARNABÉ De te chamar encantadora?... Tambem me parece que o homem deve ter modificado a sua opinião a teu respeito... (A Sebastiana) Que fazes tu ahi? a minha agua quente? SEBASTIANA Lá vou já, snr. Barnabé. (Á parte) Muito atolambada é esta menina! (Sahe pelo fundo).
SCENA IV Barnabé, Itelvina, e depois Sebastiana ITELVINA (depondo o chapeu e o chaile, vae sentar-se ao piano e canta) Trai la ri, trai la ri, trai la ró. BARNABÉ Isso é um bota a baixo! Agora é o piano que leva a sua conta...[18] ITELVINA (Cantando) «Na primavera da vida Ambos e dois muito amigos Suspiravam por um ninho, Por um ninho entre os trigos.»
BARNABÉ
[19]
Que é isso que tu cantas? ITELVINA Uma cançoneta moderna, que se chama:Um ninho entre os trigos. (Canta): E de braço dado juntos Ao repontar da manhan Iam fazer o seu ninho Nos trigos de Campanhan. BARNABÉ É mais natural que fôsse nas arvores... Os passaros em geral preferem... ITELVINA Mas não se trata de passaros. (Canta): E depois elle cantava Pousado nos ramos novos, E ella aquecia, cantando No seu ninho os caros ovos. BARNABÉ Ah! então não é de passaros que se trata? Lá me parecia que dois passaros de braço dado por Campanhan... ITELVINA É uma menina e um rapaz. BARNABÉ (pegando na cançoneta com arremesso). Basta! Deixa vêr. (Lê alto as tres quadras que ella cantou). E chama a isto um ninho o tratante do cançoneteiro! Quem diabo fez esta coisa? ITELVINA Foi um poeta inspirado. Dê-me cá a muzica, ande! BARNABÉ Empresto-t'a para a estudares, de tarde, quando eu estiver a dormir a sésta... (Á parte). Mandem lá ensinar piano ás raparigas n'uma terra em que os poetas inspirados dizem ás meninas que se fazem ninhos nos trigos de Campanhan!... e que se aquecem os ovos... O Porto está peor [20] que o Mexico a respeito de ovos e de ninhos... SEBASTIANA (entrando pelo fundo). Ainda havia agua quente. Ella aqui está (Dá-lhe a chocolateira). BARNABÉ Bem, vou para o meu quarto (Mudando de ideia). Mas, se estiveres quieta... Um pae póde escanhoar-se na presença da filha (Arranja os utensilios, e remeche o pincel na vasilha do sabonete). ITELVINA
(a Sebastiana) Veio carta para mim?... de Braga? SEBASTIANA Não, minha senhora, o carteiro passou ha muito. (Sahe pela porta do fundo) ITELVINA (comsigo mesma) É espantoso! Ha trez dias que Macario foi para Braga, e nada de noticias! Se eu não tivesse inteira confiança no seu amor... Talvez uma catastrophe! Acontecem tantas desgraças nos caminhos de ferro!... (Vae agitadamente para o pae que lhe voltou as costas e se está barbeando) Meu pae! (com intimativa)[21] BARNABÉ Que é? cuidado, que por pouco me não cortei... Que temos? ITELVINA Acha isto natural? BARNABÉ Natural, o quê? ITELVINA Trez dias de auzencia sem me escrever? BARNABÉ Ah! sim, o Macario? (Á parte) Bem me importa a mim isso... (alto) Se elle foi buscar os papeis a Braga, é preciso dar-lhe tempo. (Torna a escanhoar-se) ITELVINA (passeando) Dar-lhe tempo, dar-lhe tempo! Eu não exijo que elle volte; mas que me escreva; não se está assim trez dias... a fazer o quê?... que difficuldades encontrou? BARNABÉ Não andes assim n'esse passo que me incommodas. Fazes tremer o sobrado.[22] ITELVINA O pae não sabe o que é amor! BARNABÉ Soube-o primeiro que tu, e dou-te a minha palavra que depois que a gente sabe o que isso é, e pensa a sangue frio... não vale um caracol o amor... Tu o saberás... ITELVINA Ha tres mezes que conheço Macario, e a toda a hora maldigo as formalidades portuguezas, e pergunto de que servem para a gente se casar, papeis, banhos, tabellião, padre, sacristão... BARNABÉ Ha pessoas que dispensam tudo isso... mas (com energia) fazem mal...
[23]
fazem muito mal... Sem tabellião, e banhos, e padre e sacristão não ha honra. ITELVINA Finalmente, logo que Macario chegar com os papeis, não haverá impedimentos... BARNABÉ Isso lá de impedimentos... veremos. ITELVINA (derrubando uma cadeira, e indo direita ao pae) Haverá alguns? diga... BARNABÉ (cortando-se) Cá está um... vês tu? ITELVINA Um impedimento? BARNABÉ Um golpe de navalha... estou acutilado! ITELVINA (estancando-lhe o sangue com o lençoDeixe vêr... Isto não é nada.) BARNABÉ Arde-me... e bastante... ITELVINA Vae passar. BARNABÉ Falla-me, se queres, mas lá de longe... Eu só de longe é que ouço bem.[24] ITELVINA (afastando-se e levantando a cadeira) Faço-lhe a vontade; mas o pae fallou de um impedimento... desejo conhecêl-o. BARNABÉ É o meu consentimento. ITELVINA O seu consentimento? BARNABÉ Está claro; tu não pódes casar sem eu consentir... A lei é positiva. ITELVINA Que arrelia! Isso quer dizer que, se o pae não ama Macario, tambem eu não posso amál-o...
BARNABÉ
Lá tu amál-o pódes... mas não basta... ITELVINA Não posso casar com elle, se o pae o não amar?... BARNABÉ Não. ITELVINA As leis portuguezas dizem isso? Existem absurdos taes n'um povo livre? BARNABÉ (limpando a navalha e pondo-a sobre o contador) Tal e qual, minha filha. Ora agora, quanto a Macario... ITELVINA (passando para a esquerda) Meu pae, eu amo Macario! BARNABÉ Elle não tem chêta. ITELVINA Amo Macario! BARNABÉ Passa a vida nos bilhares e nas cervejarias. ITELVINA Mas eu amo-o. BARNABÉ Serás desgraçada com elle. ITELVINA Acabemos com isto. Amo Macario! BARNABÉ «Amo Macario, amo Macario!» Estás-me cantando o 1.º acto da Favorita«Eu o amo, eu o amo!». ITELVINA Dá ou não dá o consentimento? BARNABÉ Não. ITELVINA Não? (Pega da navalha) O pae é implacavel, hein? BARNABÉ
[25]
[26]
  • Univers Univers
  • Ebooks Ebooks
  • Livres audio Livres audio
  • Presse Presse
  • Podcasts Podcasts
  • BD BD
  • Documents Documents