Patrimônios Bioculturais na Hipermoder-nidade: a crise dos critérios de autenticidade
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Patrimônios Bioculturais na Hipermoder-nidade: a crise dos critérios de autenticidade

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Resumen
Neste artigo almeja-se analisar simultaneidades epistemológicas que estão ocorrendo no campo da gestão dos patrimônios bio-culturais na contemporaneidade. As mutações conceituais efetuadas nos domínios da genética e da cultura colocam em cena a crise profunda dos critérios da autenticidade. Essa crise sem precedentes acontece ao mesmo tempo em que se aprofunda a desorientação política e ética. Parece que chegou a hora de se estabelecer uma nova prospectiva patrimonial nesses domínios do conhecimento.
Abstract
In this article it is intended to analyse episthemological simultaneities which are happening in the field of management of the bio-cultural heritages in contemporary times. The conceptual mutations accomplished in the scopes of genetics and culture place in evidence the deep crisis of the authenticity criteria. That crisis without precedents happens the same time as it is examined thouroughly the political and ethics bewilderment. It seems that time has arrived to set up a new patrimonial prospective in those scopes of knowledge.

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Publié le 01 janvier 2007
Nombre de lectures 65
Langue Português

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Vol. 5 Nº2 págs. 243-251. 2007

www.pasosonline.org


Patrimônios bioculturais na hipermodernidade:
a crise dos critérios de autenticidade


Alexandre Fernandes Corrêa
Universidade Federal do Maranhão (Brasil)


Resumo: Neste artigo almeja-se analisar simultaneidades epistemológicas que estão ocorrendo no cam-
po da gestão dos patrimônios bio-culturais na contemporaneidade. As mutações conceituais efetuadas
nos domínios da genética e da cultura colocam em cena a crise profunda dos critérios da autenticidade.
Essa crise sem precedentes acontece ao mesmo tempo em que se aprofunda a desorientação política e
ética. Parece que chegou a hora de se estabelecer uma nova prospectiva patrimonial nesses domínios do
conhecimento.

Palavras-chave: Patrimônio; Genética; Etnologia; Política; Ética; Cultura.


Abstract: In this article it is intended to analyse episthemological simultaneities which are happening in
the field of management of the bio-cultural heritages in contemporary times. The conceptual mutations
accomplished in the scopes of genetics and culture place in evidence the deep crisis of the authenticity
criteria. That crisis without precedents happens the same time as it is examined thouroughly the political
and ethics bewilderment. It seems that time has arrived to set up a new patrimonial prospective in those
scopes of knowledge.

Keywords: Cultural heritage; Genetics; Ethnology; Politics; Ethics; Culture




† • Alexandre Fernandes Corrêa. Docente Adjunto em Antropologia do Departamento de Sociologia e Antropologia
da UFMA (PPGCS). Doutorado em Ciências Sociais: Antropologia PUC/São Paulo. E.mail: alex.f.c@ibest.com.br.,
alexcorrea@zipmail.com.br.
© PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. ISSN 1695-7121 244 Patrimônios bioculturais na hipermodernidade...

Ao introduzir o debate sobre as simulta- do o fato de não ser biólogo ou ecólogo, meu
neidades epistemológicas que estão oco- entendimento na matéria genética não é de
rrendo em domínios do conhecimento antes especialista treinado. Todavia, vai muito
tidos como estanques e incomunicáveis, faz- mais além do que surge na mídia sensacio-
se necessário adiantar alguns dados preli- nalista que se acompanha comumente nos
1minares. jornais diários .
O ponto de partida da análise aqui de- Diante dessas considerações, fica melhor
senvolvida está basicamente estabelecido explicitado que esta pesquisa atua no nível
nas pesquisas realizadas em Antropologia da transdisciplinaridade e pretende inves-
sobre a preservação de acervos etnográficos tigar possíveis simultaneidades epistemo-
2e da cultura popular na sociedade contem- lógicas . Na verdade, nesse ponto não trago
porânea (Corrêa, 1993). Depois de pesqui- novidade alguma.
sar, há alguns anos, no campo específico da O etnólogo francês Marcel Mauss no seu
Antropologia do Patrimônio, iniciei leituras Ensaio sobre a Dádiva, de 1925, escrevia:
relacionadas à biotecnologia e aos patrimô- “Após terem forçosamente dividido e abs-
nios genéticos. Esse domínio do conheci- traído um pouco excessivamente, é preciso
mento tem sido objeto de atenção muito que os sociólogos se esforcem para recompor
recorrente na mídia, quando aparecem os o todo. Encontrarão assim dados fecundos”
3produtos mais espetaculares e sensacionais (1974, p. 181) . Creio que esse caminho
da biotecnologia. sugerido não pode ser desprezado. Seguindo
Destarte, influenciado por essas leituras essa trilha, cito também um seguidor fiel
desinteressadas que começaram a chamar dessa tradição teórica e que aprofunda a
minha atenção, comecei a perceber que reflexão sobre a aproximação entre as ciên-
estavam ocorrendo algumas semelhanças cias: refiro-me a Claude Lévi-Strauss. E é
entre fenômenos e eventos nesses dois do- com esse autor que pretendo balizar o deba-
mínios do conhecimento. Pensei então na te, colocando em foco o problema, hoje tão
possibilidade de trabalhar a hipótese de negligenciado, dos critérios da autenticida-
que estamos diante de mutações concei- de nos dois domínios do conhecimento
tuais importantes no campo do conheci- apontados acima.
mento, reveladoras de um movimento mais
profundo na ordem do saber (Corrêa, 2004). Crise dos Critérios da Autenticidade
Creio que estamos testemunhando o nasci-
mento de um novo campo: o da gestão dos Claude Lévi-Strauss no seu livro Antro-
patrimônios etnográficos e genéticos, pen- pologia Estrutural I coloca em destaque o
sados num mesmo plano antropológico. Mas que designou as Missões Próprias da An-
4será ainda cedo para tais elucubrações? tropologia . Nesse texto, intitulado O lugar
Será que já podemos tirar algum proveito da antropologia nas ciências sociais e pro-
de tais aproximações, ou ainda é precipita- blemas colocados por seu ensino (Unesco-
do pensar em possíveis elos de comunicaç- 1954), Lévi-Strauss estabelece que a tarefa
ão? do antropólogo é “reconhecer e isolar níveis
No velho paradigma cartesiano esses de autenticidade” (1975, p. 408-9). Diante
dois domínios do saber são pensados de dessa missão categórica, definida há déca-
modo compartimentado, separados e frag- das, e cada vez mais conscientes de que é
mentariamente, isto é, não se considera a praticamente impossível viver em socieda-
possibilidade da comunicação entre eles. de sem algum regime de autenticidade, se
Porém, a Etnologia – através do olhar dis- entende então que sempre haverá a neces-
tanciado – nos leva a duvidar dessa pre- sidade do saber etnológico. E como escreveu
missa metodológica. Maurice Merleau-Ponty:
Tendo me dedicado ao estudo de recen- A Etnologia não é uma especialidade de-
tes pesquisas sobre as transformações con- finida por um objeto particular – etnia,
ceituais no domínio etnográfico, passei a sociedades primitivas, etc. – é a maneira
dedicar cada vez mais atenção para os de pensar que se impõe quando o objeto
acontecimentos no domínio da genética. é “outro” e que exige nossa própria
Mas é preciso que se diga que, consideran- transformação (1984, p. 199).
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 5(2). 2007 ISSN 1695-7121

Alexandre Fernandes Corrêa 245

Desde já é necessário enfatizar que no quisa com células-tronco e embriões huma-
8presente texto estamos tratando do pro- nos congelados . Esses problemas estão no
blema da crise dos critérios e não de uma centro do conflito em torno da biosseguran-
suposta crise da autenticidade. Pois esta ça, envolvendo a sociedade civil organizada,
última é uma característica própria da mo- o Congresso Nacional e diversas outras
dernidade, enquanto que na tradição não instituições como a Justiça (Procuradoria
5há crise de tal ordem . É, como veremos Geral) e o Ministério da Saúde (Comissão
mais a frente no texto, na hipermodernida- Técnica Nacional de Biossegurança); além
9de que surge algo específico, que designo das empresas de bio-tecnologia, etc.
como a crise dos critérios da autenticidade. Não é demais fazer referência também à
Aprofundando a reflexão sobre a dialógi- questão da pirataria na informática e na
ca da modernidade e da tradição, Hannah Internet. A indústria fonográfica vive uma
Arendt, na sua obra Entre o passado e o crise sem precedentes por conta dos direitos
futuro, observa que há uma acelerada e autorais desrespeitados pelos indivíduos
6crescente diluição do tradicional . Tomando que fazem gravações (downloads) piratas de
como base central as reflexões dessa filóso- músicas e canções, além da pirataria de
fa, podemos dizer que após a civilização programas e outros diversos softwares. Em
ocidental passar pela quebra entre o passa- função disso é interessante também perce-
do e o futuro, chegamos no momento em ber esse movimento mutante na cultura
que nos dirigimos para uma nova crise: a hip-hop, quando os rappers fazem citações e
dos próprios critérios de aferição da auten- réplicas caleidoscópicas de velhas canções e
ticidade da herança cultural. hits, formando um imenso amálgama musi-
Em minhas pesquisas na área da pre- cal e cultural

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